O dia que eu saí do armário está entre os piores dias da minha vida, ao contrário do que eu tinha visto em todos os vídeos/textos sobre isso. Não em relação à minha mãe, que como eu esperava, não colocou isso nem em um lugar de questão, depois de me ver com minha primeira namorada pela primeira vez, me perguntou "Amanda, você tá namorando essa menina?" eu disse que namorar era uma palavra muito forte, mas que estávamos juntas, morrendo de medo. Ela gargalhou e me chamou pra almoçar com ela no dia seguinte; me deu de presente, neste dia, uma camisa jeans que eu queria muito e na época de graduação não conseguia comprar, por entender o que aquilo significava pra mim. Em contrapartida, meu pai saiu de casa e cortou comigo o vínculo afetivo e financeiro (que foi retomado depois de alguns muitos anos). Eu tinha 24 anos, estava no final da graduação e, de repente, tudo que eu sabia sobre mim, mudou. Não porque eu tivesse mudado, mas porque eu finalmente conseguia ser quem eu era: da forma de me vestir, o jeito de falar, o corte de cabelo, as viagens, as amizades, os livros que eu lia e as coisas que eu assistia; parecia que eu finalmente estava sendo apresentada à mim mesma, depois de toda uma vida de heteronormatividade compulsória que me aprisionava em um cantinho escuro dentro de mim mesma. Desde que eu pude ser quem eu sou e, portanto, amar outra mulher eu consegui encontrar minha área de atuação dentro da minha profissão, rever minhas amizades, reconfigurar minhas relações familiares, re-estabelecer contratos com tudo e todas (os) que me cercam, pensar na possibilidade de maternar. Mas não é fácil, nunca foi, eu vivo com medo e sou branca, cis e classe média. Pra mulheres que ousam negar erótico-afetivamente o gênero dominante na nossa sociedade, é sempre difícil. Hoje eu estou aqui, com medo, mais uma vez. Não se um estupro corretivo, de ser xingada na rua, de ser agredida, invibilizada ou ameaçada - violências tão comuns à comunidade lésbica. Hoje eu tenho medo de ser descredibilizada ou julgada, temendo uma repetição ao pior dia da minha vida. Mas sabe o que aconteceu alguns meses depois que eu saí do armário? Tudo isso que eu disse aí em cima sobre ser eu mesma, se eu não me libertar do que me aprisiona, não consigo me encontrar.
Vai ter Psicóloga e Acadêmica sapatão sim. E isso não é nenhuma questão, por que a sexualidade da minha terapeuta e/ou da minha professora não interfere em nada na minha vida. E nem a minha na sua.