sábado, 26 de março de 2011

ML

É tão engraçado. A uns meses atrás eu te contava da falta que eu sentia de um certo alguém na mesma cama que eu e hoje, quando parei pra pensar nisso, percebi que a única respiração que tenho sentido falta é a sua. Lembro do nosso jeito embolado de dormir e de como nos procuramos durante a noite, do quanto buscamos os abraços um do outro durante a vida. Da maneira como você me acorda e do quanto já me faz rir pela manhã, numa sessão de cócegas e gargalhadas. Eu não te conto, mas me acostumaria com essa vida facilmente.

Apesar de sempre nos contarmos tudo, de sempre nos lermos, há uma coisa sobre mim que você não sabe: eu gostaria de me acostumar com essa vida. Nesses últimos dias, a cada vez que fechava os olhos ao seu lado, seja no ônibus voltando de uma viagem ou dormindo no seu abraço, vinha tudo formado na mina retina descansando. Seus olhos negros se despedindo de mim a cada noite para repouso, orações abraçados, uma tarde na praia vendo o nascer do sol ao som do seu violão, guerra de sorvete num parque (como aos 15 anos), noite de núpcias, casamento militar com minhas amigas babando nas fardas dos seus amigos, uma vida tranqüila, em paz. Entretanto, o que veio mais forte nisso tudo, o que me fez passar a mão em meu ventre parar que eu lembrasse que aquilo era imaginação e não realidade foi a imagem de um filho. Um filho nosso. Uma criança morena, com o rosto parecido demais com o seu, com a diferença das sardas crescentes sobre o nariz e a bochecha e o cabelo castanho claro, feito o meu. Confesso que essa idéia me perturbou, confesso que a partir daquele momento eu passei a te querer verdadeiramente. Eu passei a pensar em largar tudo e ir com você pra onde quer que você for. Transfiro a faculdade, faço novas amizades, aprendo sotaque gaúcho, me habituo com o gosto do chimarrão, desde que isso me leve pro mesmo caminho que você.

Costumamos dizer que seguimos o mesmo caminho, com direções diferentes. Hoje te digo que eu seguiria seus passos. Eu, a que sempre fez campanha feminista e contra mudar a vida pelos outros, digo que mudaria tudo e iria com você, digo que escolheria a direção dos passos com a ajuda dos seus parâmetros.

Eu espero que o nosso reencontro não se atrase e que, quando ele chegar, eu tenha decidido que todas essas palavras foram devaneios passageiros ou que, enfim, seja a hora, a nossa hora, como gostamos de chamar.

Eu sinto a falta da sua respiração.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Despedida

Em direção oposta ao imenso pesar que retornei a terra gélida é com grande prazer que amanhã volto ao meu reino da alegria, a minha passárgada. Despeço-me do frio que me acolheu, da rede na varanda, das minhas amadas montanhas na janela e volto, com a esperança de ter aprendio a lição. Volto leve, com a consciência tranqüila de quem errou, reconheceu o erro e lutou pro seu conserto. Volto com marcar, cicatrizes profundas que ao contrário do que dizem, não dói, serve apenas pra mostrar até onde posso ir, retornar.
Medo? Ainda o tenho. Andamos conversando muito nesses meus cinco meses de estadia, ele insiste em seguir viagem comigo, eu cansei de mandá-lo embora, deixo-o aqui dentro pra que ele aja quando for sua hora, para que ele me proteja dos meus próprios e equivocados anseios. Vez ou outra ele surge em hora imprópria, vez ou outra ele vem me mostrar que ele que manda (ou acha mandar) me impedindo de ser e fazer o que antes para mim era fundamental. Brigamos um bocado, mas agora hasteamos a bandeira branca.
Feito como conversava com um grande amigo hoje, percebi que a vida é como uma vela acesa, ilumina o ambiente, basta um sopro forte para apagá-la. Somos tão frágeis e teimamos em nos achar super-heróis, semi-deuses e muitas vezes Ele próprio. Hoje vejo, que assim como pequenos ventos deformam o formato do fogo na vela, pequenos ventos também deformam a vida. Voltei pro lugar, tal qual o fogo, estou de pé, acesa. Entretanto agora que sei da possibilidade de ser levada pelo vento, tenho usado casaco, cachecol e permanecido em abrigos quando acho que só isso não me protegerá. Eu aprendi a lição.
Levo comigo, desta terra, não só as lágrimas de sofrimento, as dores e angústias de achar que aquilo tudo nunca mais fosse passar. Não levo apenas a certeza dos bons e muitos amigos que permaneceram ao meu lado, fisicamente ou não se fazendo presente a cada novo passo dessa minha reabilitação. Não apenas o vínculo de amor, companheirismo e lealdade fortalecido e apertado ainda mais com meus pais. Hoje, eu levo comigo, uma nova Amanda. Uma nova maneira de ver o mundo, só minha, que só cabe a mim, uma nova experiência que é o que faz a vida. E acima de tudo a plenitude que tanto busquei fora, dentro de mim, em mim. Hoje, eu levo comigo não só a Amanda universitária, tampouco a Amanda que tanto me cobraram por ter se perdido do começo de 2009. Segue comigo nessa estrada a Amanda bebê, a Amanda aprendendo a andar, a Amanda aprendendo a ler e escrever. Segue comigo a Amanda pré-adolescente com espinha na cara e sangue entre as pernas. Segue a Amanda do primeiro beijo, do primeiro amor, dos muitos namorados, da primeira vez. Segue todas as Amandas que eu fui e, não menos importante, todas as Amanda que ainda vou ser.
Amor, Amanda, Amada.
Agradeço a mim mesma por todos os meus erros, obrigada por me fazerem o que sou hoje.