quarta-feira, 20 de maio de 2015

Rivotril

Amanhã à noite eu vou te beijar pela primeira vez.
É quarta feira e pelos caminhos do destino, você tá bem longe do meu cobertor de berinjela e do potinho de brigadeiro que eu comprei pra passar essa noite fria. Um ano se passou. Eu gosto de refazer o trajeto, eu não ligo pras datas, mas eu amo as histórias. Eu sou apaixonada pelo fato de que 365 dias atrás eu estava sentada em um bar com amigos em comum, tentando não fazer cara de boba na sua frente: eu estava totalmente encantada pela mulher que me disseram 345680 vezes pra não me apaixonar e não fazia nem 2 horas desde o momento em que eu estava assistindo à capoeira de um amigo, que também está sentado à mesa agora,esperando-a chegar. Você me olha sorrindo a cada piada que contam e eu não sei bem se tenho que olhar pra você ou desviar o olhar ou o que eu faço com as mãos, meu rosto torto, meu corpo no mundo. Eu vou chegar em casa jajá - meu amigo vai dormir em casa e amanhã acorda cedo, de modo que nossa despedida essa noite será em breve, e vou te mandar uma mensagem no celular dizendo que queria ter ficado mais tempo com você. Talvez se esse amigo não tivesse me dito que você me olhava do mesmo jeito que eu te olhava, se não tivesse soltado um "confia no meu feeling que nunca funciona comigo" eu não tivesse dito nada e não tivesse acordado com um "bom dia" seu no meu celular e não tivesse te chamado pra sair.
O amanhã chegou e hoje eu vou andar na garupa da sua moto pela primeira vez, segurando você com uma mão e a barra lateral traseira da moto com a outra, pra que se a gente cair, eu conseguir me segurar no que parecer menos mortífero. Você vai tá com a mesma roupa de ontem e a primeira coisa que eu vou pensar vai ser "a noite foi boa, hein gata" seguida da segunda "putz, como ela é linda, to muito ferrada!" e então, entre um semáforo e outro vou perguntar como foi seu dia, porque a verdade é que eu gostaria de ter feito parte dele.
Chagaremos ao bar, sentaremos numa mesa num cantinho do meu bar preferido da cidade na época.E eu vou beber uma cerveja atrás da outra, quase sem respirar, pra aguentar a taquicardia que tomou conta de mim, os intervalos entre os copos são só pra disfarçar a tosse que tinha se alojado na minha garganta e não saía mais. Naquela mesa eu te contei a trajetória de quase todos os meus relacionamentos e você me contou a história de quase todos os seus amores. A gente riu das pessoas que escolhiam namorar e se dar satisfação - que gente patética. A gente falou de psicologia, de arte, de filosofia. Bêbada, eu falava com você como se tivesse falando comigo, cheia de "não sei se devia tá te falando isso". Aquela noite, entre um carinho e outro, um assunto e outro, você me beijou ali,no meio do bar - eu que nunca beijo ninguém pela primeira vez (nem pela segunda, terceira ou quarta) em público, retribuí e não quis mais largar seu abraço.
Mas a hora avança sem piedade - um ano depois e ainda é assim sempre que estamos juntas -, são quase 4h da manhã e amanhã é dia e trabalho pras duas - pra você mais cedo do que pra mim e temos que deixar o bar. Você me traz na porta de casa e fica difícil parar com o beijo que começou a nem sei quantas horas atrás. "Se você não for embora agora, eu não vou te deixar ir mais". Você não foi e, como eu te avisei, você continua aqui. E eu, que nunca consigo escolher nada, encontrei o único melhor lugar do mundo dentro daquele abraço de nuvem.
Meu celular tá apitando com mensagem sua, estamos longe fisicamente,ao contrário do que eu gostaria no dia de hoje. Mas não importa,nada importa: Amanhã à noite eu vou te beijar pela primeira vez.

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