Dizer adeus pra você fi a coisa mais difícil que eu já fiz na vida. Eu sempre achei sem noção gente que fica falando com quem já morreu pela internet através de redes sociais, que fica postando foto e lamentando quando a pessoa nem tá ouvindo ou lendo mais, lembro de sempre te dizer isso e a gente achar engraçado, mas entender que cada um tem um jeito de sofrer e que às vezes a gente precisa falar pro nada o que a gente não teve coragem de dizer olhando no olho. Até hoje.
Eu fico pensando no tanto de coisa que eu queria te dizer sem conseguir formular. Ao mesmo tempo sabendo que você sempre soube tudo sobre mim, eu sempre te disse que você é a pessoa no mundo que mais podia ferrar minha vida e era verdade: você estava presente em 90% dos momentos mais importantes da minha vida desde que a gente tinha 11 anos, não sabia o que era beijo, amor, responsabilidade, dor. Mas, exatamente por saber, você nunca usou nada contra mim, taí uma das milhares de coisas que você me ensinou: jamais usar a fraqueza do outro com ele (a não ser que a fraqueza seja ter medo de ter o nariz roubado), jamais encontrar justificativa pra entregar alguém. Ontem, no seu velório, a cada vez que eu abraçava alguém eu lembrava de uma história sua muito boa "esse é o tio que ele contava das noites de acampamento, com quem aprendeu tudo de camping que me passou", "essa é a menina por quem ele se apaixonou de verdade a primeira vez", "eu já fui pra um cachoeira com esse garoto uma vez junto com ele", "aquele filme que eu vi, foi ela que indicou pra gente", "eu nunca mais vou conseguir ouvir essa música sem ele", "essa menina também aprendeu a fazer pulseirinha com ele", "eu chorei 5 dias abraçadas com você quando esse cara me deu um pé na bunda". Entre tantas coisas que não cabem escrever ou não consigo formular. Ontem, eu e nossos amigos sentamos numa mesa do lado de fora e ficamos contanto todas as histórias suas que lembrávamos e a gente riu muito, porque você é um idiota sem tamanho que só fazia a gente rir o tempo inteiro. E meu coração doeu demais - e ainda dói - porque eu olhei pro lado procurando seu olhar pra rir comigo e não achei, porque eu fiquei procurando algum abraço que me livrasse de tanta tristeza como o seu sempre fez e não encontrei em lugar nenhum. Por que ninguém conseguiu me abraçar e falar "calma, baleia, vai passar e eu to aqui", porque ninguém sabia que você tinha ficado do meu lado quando ninguém tinha ficado, que eu costumava te dizer que você era o que tinha ficado do que não ficou e que eu te amo tanto por ter ficado, eu te amo tanto por você ter me deixado ser sua amiga, eu te amo tanto por você ter dividido sua vida comigo, eu te amo tanto por você ter ido como herói, como alguém que todo mundo amava, mesmo sem entender muito, porque você também nunca entendeu muito as minhas escolhas e também me amava. Eu te amo tanto e na minha cabeça, toda vez que eu te via, inacreditavelmente sem vida dento daquele caixão, eu tinha que me segurar pra não te abraçar e te agradecer por tudo, queria te dizer pra levantar logo dali que o susto já tinha sido o suficiente e eu que eu nunca mais vou implicar com sua barba estranha ou com sua demora pra revisar cachinho por cachinho antes de sair, nunca mais vou zangar com você, por favor, Bateju, levanta, acorda, diz pra mim que eu to dentro de um pesadelo, vem aqui, começa comigo de novo, com a gente com 11 anos correndo pelo pátio da escola e você me derrubando no chão me fazendo ralar o joelho, vem ser pré-adolescente rebelde, vem cantar los hermanos comigo, vem me ensinar a montar uma barraca e me levar pra subir todas as pedras da cidades. Vem ver o pôr do sol no mar e sempre molhar o tênis, vem tomar caixote e dividir uma prancha com mais 8 pessoas que também não sabem surfar, vem me dar bronca porque eu falo palavrão demais,vem dizer que vai ficar tudo bem.
Obrigada. Te dizer adeus foi a coisa mais difícil que já fiz na vida. E agora preciso aproveitar tudo por mim e pela pessoa que me ensinou a amar cada sensação que natureza pode proporcionar, viver por dois.
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